Quase tudo se explica pela continuidade de eventos. Situações que se relacionam umas com as outras, uma coisa desencadeando a outra, que é uma das várias definições de uma “cadeia”.
Assim, fulano foi almoçar com amigos e achou que, por serem amigos, estava imune a todos os vírus do mundo. Ninguém almoça sem tirar sua máscara, logo deveríamos comer sozinhos quando não estivermos em casa, em plena pandemia. Beltrano não acredita que um vírus pode matar gente jovem, mas não vê, não sabe ou não entende que o vírus sai de sua boca, de sua tosse e de sua fala até chegar a uma pessoa velha.
Mas o vírus também está matando gente jovem. O vírus se espalhou tanto que sofreu mutações. As mutações parecem que se espalham mais rápido, principalmente se o sicrano foi a um baile clandestino ou se aglomerou na praia num carnaval onde as gotículas de saliva são como confetes infectantes.
A ignorância é multifatorial. Ela pode crescer tanto numa infância pobre sem estudo quanto num jardim florido de uma mansão qualquer. Ela também tem várias faces e pode ser apimentada por crueldade, ideologia ou só burrice mesmo.
A cultura, a ciência, o acesso à informação, as escolas, o debate e a democracia podem combater a ignorância e ideologias intolerantes e genocidas, como grandes elos de uma cadeia pela vida.
Hoje, enquanto escrevia este texto, soube da morte de uma querida colega de enfermagem. Não morreu de hipertensão, câncer, diabetes ou acidente de trânsito. Morreu, como outras milhares de pessoas, de covid. Contraído talvez do fulano que abraçou o beltrano, que estava sem máscara, que ouviu do sicrano que ouviu na tv numa transmissão em cadeia que a pandemia era só uma gripezinha.
Quando um governante ignora a ciência, ironiza vacinas, estimula o descuido e trata vidas humanas com desprezo, ele me lembra o conceito mais conhecido de cadeias, aquelas reservadas aos genocidas.
Que tua alma encontre a paz, Sueli.
Nardély Ilha - Médico pediatra. Mar/2021.
Muito triste, amigo. Acompanhei os últimos dias da Sueli antes da internação, pois a impressão inicial era que podia ser um evento adverso da vacina. Só que o esposo começou com sintomas, e não foi vacinado. E em 24 horas tudo desencadeou, horrivelmente.
E o PCR, positivo para COVID.
A vacina chegou tarde para ela. E para milhares de brasileiros que morreram nesta "3a onda". Se tivéssemos começado a vacinar em dezembro, como o resto do mundo, ela estaria ainda lá, cuidando da criançada.
Será que o (ir) responsável por este atraso, por pura birra e xenofobia, consegue deitar a cabeça no travesseiro e dormir?